A POSTURA DO MEIO

 


"No meio está a virtude (eventualmente até quando...)"

Já antes de Aristóteles a frase "No médio está a virtude" era regra de bom posicionamento individual. Mas notem, é uma frase que em si pode encerrar muita radicalidade no sentido em que "radical" significa ir à raíz. Ser-se fiel a princípios universais e não ceder a relativismo, por exemplo. "Eventualmente até quando..." apela a essa mesma fidelidade radical aos limites do que se pode e deve tolerar. 

"Quousque tandem abutere Catilina patientia nostra?

Esta é a primeira frase do primeiro dos quatro discursos de Cicero, acusando Lucio Sergio Catilina, cônsul romano, de pretender derrubar o governo republicano e apoderar-se do poder e das  riquezas, juntamente com alguns apaniguados.

A frase poderia ser traduzida como “Até quando Catilina abusarás da nossa paciência?”"

Politicamente, o centrismo procura traduzir essa posição individualmente virtuosa numa Postura de Meio em que face aos extremos nos colocamos numa posição equidistante e negociada, equilibrada que permita entre outras coisas, que o modelo sócio-político se vá desenvolvendo, absorvendo insumos de todas as áreas, vertentes e facções. Teoricamente é uma posição positiva e benéfica que pode assentar numa visão humanista e racionalista que vê todos os homens como intrinsecamente bons numa concepção rousseuniana de Bom Selvagem.   

O centrismo é bonito e atractivo, claro, nessa perspectiva humanista antropologicamente optimista. O problema é que assenta numa visão teológica de um mundo onde o Bem e o Mal se tornaram conceitos relativos. Onde outras forças agem por via da acção de movimentos culturais ancestrais que visam o Solve e Coagula que o Nuno Lebreiro tão bem explicou aqui e o Arcebispo Viganò também tinha explicado aqui

É o não reconhecimento dessas forças, talvez por afastamento cultural da área de pensamento católico ou religioso que pode ser alienante para quem opta pelo centrismo político. Por via dos sistemas de ensino, editoriais, mediáticos, o pensamento religioso de enquadramento da luta entre Bem e Mal, como algo atávico, perene e - real - na História Humana foi relegado para um plano de atenção (até mesmo meramente hipotético) onde apenas vivem pessoas reiligiosas ou especialistas e intelectuais fora do mainstream cultural. 

Mainstream esse, profundamente afastado do centro cultural tradicional, pelo foco da  atenção mediática social sistémica e sistemática em "coisas" materiais e culturas pop alienantes face ao âmbito e componente espiritual do etos social. Ou seja, o centrismo extrinça a espiritualidade da política? Tal como os liberais extrinçam a cultura e os costumes da sua intervenção política que entendem dever ser apenas económica. Tudo se reduz a "impostos", "investimento" e "liberdade económica?    

Ou seja, o centrismo pode ser profundamente relativista e o relativismo pode gerar o niilismo social (ou seja pensar-se que nada vale a pena, tudo é passageiro, nada é eterno porque não há Bem nem Mal absolutos) e a vida pode ser reduzida à sua pura condição material sem precisarmos de encarar consequências morais além das meras conveniências momentâneas individuais. 

O problema é que o Bem e o Mal existem como absolutos.

Um exemplo de Bem Absoluto: um bebé recém-nascido, inocente, dependente que é a maior dávida do mundo para os seus pais agradecidos pela dádiva de Vida e Criação.

Um exemplo de Mal absoluto: um psicopata que estupra uma criança e a mata por puro prazer destrutivo. 

Um exemplo de relativismo centrista: Já se diz relativamente à actual justiça que é "vítimo-cêntrica". Que se foca nos aspectos psicológicos, motivações e sofrimentos dos autores dos crimes que devem ser entendidos, percebidos e apoiados na sua regeneração que se crê possível. Ora, um psicopata como o do exemplo do Mal anterior recuperar-se-á? Neste debate, até mesmo a doutrina religiosa aceita a pena capital (de morte ou perpétua). O centrismo, talvez ingenuamente, prevê a possibilidade de recuperação do culpado: "Um coitado que deve ser entendido relativamente às suas cirunstâncias e condições". A presunção de Inocência dada ao psicopata assassino. Tudo é relativo. 

Ora então chegamos ao ponto de conluir. Havendo Bem e Mal absolutos, a posição de relativismo não será uma que permite intrinsecamente o desenvolvimento do Mal? Não deixa, por essência, prosperar os psicopatas e os sociopatas?

Não estamos nós a assistir ao avanço forte do Mal na nossa civilização ocidental? 2020 não nos ensinou que há um manto negro que se estende sobre os nossos espíritos e vidas? O que falta para compreendermos que de facto a tolerância face ao Mal, o relativismo, nos tem trazido mais Mal?  

Deixo-vos com a mais radical, básica, simples e extremista das posições virtuosas: os 10 Mandamentos 

1.º - Adorar a Deus e amá-lo sobre todas as coisas.
2.º - Não usar o Santo Nome de Deus em vão.
3.º - Santificar os Domingos e festas de guarda.
4.º - Honrar pai e mãe (e os outros legítimos superiores).
5.º - Não matar (nem causar outro dano, no corpo ou na alma, a si mesmo ou ao próximo)
6.º - Guardar castidade nas palavras e nas obras.
7.º - Não furtar (nem injustamente reter ou danificar os bens do próximo).
8.º - Não levantar falsos testemunhos (nem de qualquer outro modo faltar à verdade ou difamar o próximo)
9.º - Guardar castidade nos pensamentos e desejos.
10.º- Não cobiçar as coisas alheias.

Poderão não concordar com todos os 10 Mandamentos, mas podem também verificar que são radicais e que escolher o "médio", a virtude, pode ser profundamente radical. São simples, sim, mas extremamente pragmáticos, claros e operativos. Profundamente limitativos, na sua essência, da orientação moral e ética humana. 

"Não roubarás, Não matarás" são linhas precisas face ao Mal, face aos Catilinas do Mundo. Defendê-las será virtuoso? Sim ou Não? Aqui, o "talvez" não existe se defendermos uma postura Moral. Se optarmos pelo "talvez" deixamos espaço aos Catilinas. 

Quousque tandem abutere Catilina patientia nostra?




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